Peço desculpas pelo comoção com que irei escrever este email.

A morte do João Luís foi enorme  choque enorme para mim. Um enorme choque, que me levou a chorar desalmadamente como uma criança, e da qual ainda não me recompus, isto se for possível uma pessoa se recompor da perda de um amigo destes.

Não vos vou falar do João Luís da Ciber, nem do advogado, mas da pessoa e do amigo.

O João Luís foi uma daquelas raras pessoas que contribuiu para o que eu sou, para o meu ser.

Orgulho-me de ter o ter conhecido e privado com ele,  e mais que tudo de ter sido um dos privilegiados  com a sua amizade. A amizade do JL não era uma amizade qualquer. Era uma amizade profunda e libertadora.

O JL era um enorme coração, de uma bondade extrema, que apenas aparentava ser um homem forte, quando era um sentimental.

A amizade para ele, não era um interesse, nem um exercício social nem de conveniência. Era uma cultura, um valor que cultivava como ninguém.

Ele era um verdadeiro amigo dos amigos, amigo com quem nos sentíamos bem e principalmente seguros.

Ele era o amigo, o confessor, o conselheiro, o brincalhão, o erudito e por vezes a nossa consciência.

Como amigo, dizia frontalmente as coisas, com uma aspereza misturada com carinho que só quem privou com ele, sabe o que isto significa.

Sempre pronto, sempre disponível, sempre acessível.

O João Luís era um homem de raríssima inteligência, o que lhe valeu ciúmes, invejas e inimigos, pois muitos sentiam-se intimidados por uma pessoa da sua craveira intelectual.

Essa sua raríssima inteligência, erudição, sabedoria, cultura, capacidade de síntese, de analise, de riscar o acessório e discutir o essencial, de analisar as pessoas, os discursos, as entrelinhas, valeu-lhe um enorme numero de admiradores, mas também de inimigos, que não toleravam ou podiam aceitar essa superioridade intelectual do João Luís.

O João Luís era um amante do direito e especialmente da Ordem, um cultor do mundo jurídico e judiciário, e um raro estudioso que sabia o que dizia e mais que tudo, como dize-lo. Mesmo assim, tinha uma cultura fora do vulgar, e tempo para dedicar a todos os que o rodeavam.

O JL não tolerava a estupidez, a mediocridade exaltada, (não da mediania, mas da mediocridade), os arrogantes, os intelectualmente desonestos, os carreiristas e especialmente os chicos-espertos que querem fazer dos outros parvos.

Quem o conhece, sabe que o que ele escrevia poderia por vezes parecer ácido, azendo, mas quem o conhecia, sabia que as palavras ditas teriam um significado diferente, um tom alegre e coloquial, e uma mão estendida a uma franca discussão.

O João Luís tinha uma  humildade impressionante.

Recordo que pouco depois de ter publicado a sua excelente obra, um confrade lhe colocou uma hipótese sobre o mandato. Respondeu de imediato que não sabia a resposta e que nunca lhe tinha ocorrido tal hipótese.

Muitos, ficariam uns dias de fora, preparando uma resposta, estudariam o assunto, e viriam com a resposta. No entanto disse “não sei, nunca tinha pensado nisso”!

Isto é grandeza, isto é excelência e humildade.

A sua voz, as suas gargalhadas, o seu riso, o seu humor, ainda elevavam mais esse ser.

O JL , principalmente era um homem livre, que agora se tornou plenamente livre.

Tenho o privilégio de acreditar em Deus e na vida após a morte, esperando pelo dia em que possa regressar ao seu convívio.

Até lá, espero poder honrar a sua memória e ser pelo menos metade do homem que ele é e foi.

Desculpem este email, mas senti uma forte necessidade de relembrar o meu amigo, meu amigo.

 

Para tí João Luís: até sempre meu bom amigo. Lembra-te de mim!

 

João Centeno